A guerra por trás da vacina contra a covid-19

Por trás da cura para a Covid-19 existe muitos interesses

A AstraZeneca prometeu não lucrar com sua vacina “durante a pandemia”, mas essa promessa traz uma pegadinha: quando a pandemia termina? A resposta não é conhecida agora e, certamente, não deve ser dada por uma empresa. Porém, no Brasil, a farmacêutica acabou ficando com direito de decidir quando a crise acaba e, portanto, quando ela poderá parar de vender doses a preço de custo. É o que indica o acordo entre a empresa e a Fiocruz, que teve trechos divulgados pelo Financial Times e, mais tarde, pelo colunista do UOL Jamil Chade.

Segundo o documento, o que está sendo chamado de “período pandêmico” pode se estender além de julho de 2021, mas só se a AstraZeneca, “agindo de boa fé, considerar que a pandemia SARS-CoV-2 não acabou“. É claro que a empresa não tem o poder de definir políticas públicas nem de estabelecer critérios que indiquem o fim de uma crise sanitária em um país ou no mundo. Mas, para fins comerciais, sua palavra vai valer. E isso já significa muito: quer dizer que, a partir de julho, basicamente está nas mãos da AstraZeneca decidir subir ou não o preço das doses. O acordo com o Brasil prevê a transferência de tecnologia para que o imunizante seja produzido aqui mas, como já dissemos em outros momentos, não há tanta certeza sobre quando o processo será finalizado.

O acordo não foi divulgado na íntegra, e os detalhes de todos os contratos firmados entre a AstraZeneca e diversos países são escassos. A empresa soltou ontem um comunicado dizendo que “desde o início” sua abordagem “tem sido tratar o desenvolvimento de vacinas como uma resposta a uma emergência de saúde global, não como uma oportunidade de negócios“. A ver…

Em tempo: a Moderna também anunciou que, “enquanto a pandemia continuar”, não vai aplicar suas patentes relacionadas à covid-19 a outros fabricantes, e que está disposta a licenciar a patente para terceiros no período pós-pandêmico.

O QUINHÃO BRASILEIRO

Em coletiva de imprensa, o Ministério da Saúde falou sobre quantas doses de vacina espera ter até ano que vem. Pelas suas contas, serão  140 millhões doses no primeiro semestre de 2021: 40 milhões vindas da Covax Facility (à qual o país já pagou R$ 830 milhões dos R$ 2,5 bi previstos) e mais 100 milhões do imunizante de Oxford/AtraZeneca. Isso no caso de as vacinas terem bons resultados na fase 3 dos testes, é claro. Para o segundo semestre, a pasta promete chegar a um total de 300 milhões de doses. O percentual da população que conseguiria ser vacinado depende da quantidade de doses necessárias, e os critérios para aplicação das vacinas não foram estabelecidos; segundo o governo, vão chegar até o fim do ano.

Falta algo nessas estimativas do Ministério: a Coronavac, feita pela Sinovac. Via acordo com o governo de São Paulo, a empresa se comprometeu a enviar 46 milhões de doses para o Brasil e a transferir tecnologia para o Instituto Butantan. E já faz um tempinho que o estado tenta negociar investimentos adicionais com o governo federal, para aumentar a capacidade de produção e distribuir ao resto do país também. Ontem Eduardo Pazuello se reuniu com o secretário estadual de Saúde, Jean Gorinchteyn, e com o presidente do Butantan, Dimas Covas, para discutir a situação. A ideia, segundo a colunista da Folha Monica Bergamo, é que o governo federal aloque R$ 92 milhões na aquisição de equipamentos para o Butantan, e que adquira doses para distribuir a outros estados via SUS. Mas não tem nada certo. Ainda segundo Bergamo, o governador João Doria tem uma reunião hoje com senadores de vários estados para pensar um plano B para a distribuição, caso a negociação com o governo federal não vingue.

Quanto à Coronavac e às vacinas chinesas em geral, uma matéria no site da Nature traz uma interrogação pertinente. Não a respeito da sua segurança e eficácia (uma vez que os testes estão em andamento), mas sobre a possibilidade de que haja tantas doses disponíveis para exportação. O país tem prometido tornar suas vacinas acessíveis a vários países de média e baixa renda na África, na América Latina e na Ásia; há também acordos de distribuição com os países onde elas estão sendo testadas (como o Brasil). Mas, ao mesmo tempo, no mês passado o chefe da força-tarefa de vacina contra covid-19 do governo, Zheng Zhongwei, disse que a China terá capacidade para produzir 600 milhões de doses até o final do ano e mais um bilhão em 2021.  Pode parecer muito, mas fica pouco quando lembramos que o país tem 1,4 bilhão de habitantes, e que a grande maioria ainda não recebeu nenhuma vacina. “O número de doses disponíveis na China será de longe muito pequeno para permitir a exportação, a menos que uma decisão política seja tomada para enviar vacinas para o exterior”, diz Klaus Stöhr, ex-chefe da unidade de resposta a epidemias da OMS.

A propósito, o governo chinês acaba de anunciar sua adesão à Covax Facility, mas ainda não há informações sobre o recurso que vai ser destinado à iniciativa.

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